sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

NADA E TUDO - Título Provisório - CAPÍTULO TRÊS


TRÊS

Percebi que o rubro liquido tinha seu efeito sobre mim, pois estava nauseado.
         “É isso, a embriagues está me fazendo alucinar!” – Pensei.
         Tentei ascender à luz, apalpei o interruptor uma, duas, três vezes em vão. Ascendi uma vela.
         Deitado naquele leito de solteiro, que nunca antes tinha me parecido tão imenso, desconfortável e gélido, meu olhar perdeu-se na chama bruxuleante que parecia dançar suavemente, mas, à medida que o tempo passava, o ritmo foi tornando-se mais intenso, algo chocante e selvagem. O leito começou a girar velozmente, agarrei-me com força aos lençóis de grosso algodão para não ser lançado longe. Todos os objetos, tudo o que existia ali parecia dançar, festejar. Os quadros nas paredes riam deliciosamente, até as próprias paredes contraiam e expandiam.
         Eu sentia uma solidão terrível, estavam zombando de mim. Rindo-se de mim. Festejavam contra mim. Uma fúria crescente me dominava, então berrei com todas as forças de meus débeis pulmões.
         Chamei por ele, eu precisava dele. O Nada, onde ele estava naquele momento? O que estaria fazendo? Por que não enfrentei o meu medo e continuei nos Lamentos com ele? Por mim ele havia tomado forma, por mim criou vida, tinha de estar ao meu lado. E se alguém se aproximasse dele? E se ele não viesse mais até mim? Se outro aparecesse? Sentia remorsos por tê-lo deixado, ciúmes por uma beleza, uma vida, um alguém que não existia.
 De repente aquela festa inanimada, insana, sem som, aquele espetáculo monstruoso, cessou, tudo estava em seu lugar como antes, coisa alguma se movia a não ser a chama da vela que balançava.
Aos poucos aquele ponto de luz, que tinha iluminado tudo até ali tão bem, foi-se tornando menor. As coisas a minha volta pouco a pouco foram sendo engolidas pela escuridão. Um grande peso estava sobre minhas pálpebras, os músculos dos meus membros superiores estavam doloridos e cansados, só aí percebi o quanto de força tinha feito para não ir ao chão, quase não podia movê-los, eu mesmo estava exausto física e mentalmente.
Muito embora precisasse, eu não queria, eu não podia. Mas a chama estava cada vez mais distante, menor. Jogaram areia em meus olhos, senti uma presença outra que não a minha. Comecei a virar-me, revirar-me, mexer-me, remexer-me naquele leito, entretanto sempre com os olhos fixos na chama. Minhas narinas foram invadidas por um forte odor, algo que remetia a eras passadas, outros tempos. Um cheiro de calêndulas, rosas, damas-da-noite e jasmim, acho que o mesmo das histórias contadas sobre ele, um perfume capaz de seduzir os homens, as mulheres, amansar qualquer fera, enfurecer qualquer donzela. Aquele cheiro era o do atroz destino, do senhor atemporal, do senhor da Dama-das-Camélias.
 Não, não e não..., a chama estava quase sumindo, não conseguia relaxar, e, se o fizesse, poderia esquecer tudo.
Não, não ainda!
 Escuridão... Adormeci.

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