QUATRO
O dia, cheio de
vapores pesados e tediosos, já ia alto quando acordei. Tinha sido uma noite
difícil, um sono estranho, pesado, sem sonhos, pareceu-me que eu pouco havia
repousado, pois me sentia muito cansado ainda. Meu corpo inteiro,
principalmente os braços, estava dolorido, minha cabeça latejava. Passei algum
tempo ensaiando levantar-me, mas faltava-me ânimo e forças.
Os
raios de luz que passavam por entre as frestas iluminavam irregularmente. Eu,
deitado, ouvindo o som da vida correndo no ambiente exterior e da minha própria
respiração, fazia um balanço sobre aquela estranha noite.
Eu
revivia, mentalmente, cada cena da véspera e, apesar do calor, cada vez que me
lembrava dele, de seu toque, de seu beijo, sentia um arrepio gelado percorrer
minha espinha. Entretanto, naquele momento, a sensação mais estranha que eu
sentia era quando me lembrava de seu olhar.
Seu
olhar era frio, impessoal, algo perdido entre a inocência de uma criança e a
tortura animalesca de um viciado em jogo. Parecia quente de desejo, porém um
desejo que coisa alguma seria capaz de impressionar ou satisfazer com o que
quer que fosse. Olhos que já viram muita coisa, de quase tudo, mas que não se
impressionava. Parecia ter sede. Sede de ser visto, de ver, fome de vida!
Então
senti sua falta, ele já fazia parte de mim, já o amava, precisava dele
desesperadamente. Mas como encontrá-lo? Era o Nada por quem eu havia me
apaixonado. Era impossível saber de onde vinha. De todos os lugares ou de lugar
nenhum? Existiria alguém que o conhecesse e que me apontasse o caminho?
O
desespero passou a apoderar-se de mim, de súbito levantei-me, escancarei as
cortinas e janelas, a claridade exuberante invadiu o aposento de uma só vez,
minha visão turvou-se. Tentando fugir da luz, me virei, deparando-me com um
espelho, percebei um brilho diferente em meus próprios olhos, havia novas
expressões naquele rosto, julguei, seriamente, se aquele era mesmo eu. Sim, era
realmente eu, só que agora estava impressa em meu rosto uma prova irrefutável
do amor que eu sentia. Tudo o que eu via diante daquele espelho era a imagem
assustada da felicidade sofrida.
Em
pouco tempo esta eu lá, novamente, exatamente como na véspera. Nos Lamentos,
sentado no cálcio moldado eu esperava por ele.
À
tarde mal havia principiado quando o Nada apareceu. Depois de um comprimento
breve e sem importância seguiu seu caminho, como se o que tivesse acontecido
não tivesse tido nenhuma importância. Fiquei sem saber o que pensar ou fazer,
sua indiferença doeu em mim. Aquilo não podia ser. Foi por mim que o Nada tomou
forma, foi por mim que ganhou uma vida. Por mim, tinha sido por mim!
Cada capitulo mais profundo! Gostei desse tambem...
ResponderExcluirLuma