quarta-feira, 30 de novembro de 2011

NADA E TUDO - Título Provisório - CAPÍTULO DOIS


DOIS

Quando finalmente me dei conta, o Nada já estava sentado ao meu lado. Disse-me alguma coisa que não consigo lembrar o que é, respondi algo que também não lembro. Daquele momento as únicas coisas de que tenho lembranças são dele ter pego a garrafa da minha mão, ter dado um grande gole, e dizer:
         “Então, me beije!”
         Como um autômato, sem poder avaliar o que estava fazendo, o beijei. Entretanto, não fora um ato puramente mecânico, o fiz como nunca tinha feito com ninguém. O beijei com volúpia, gana, vontade. Pude sentir a vida correndo de um lábio ao outro que não existia, pela primeira vez, desde meu primeiro beijo, me entreguei como um recém-nascido se entrega sequioso a doce auréola do seio de sua mãe. Os poucos segundos que duraram esse beijo, foram eternos. Eu não possuía corpo, alma. Eu era apenas energia.
         Estava completamente envolvido naquilo, os meus olhos fechados me mostravam todos os detalhes do Nada, pude definir o som que ouvia. Aquele som grave e continuo era as batidas do meu coração que acelerava cada vez mais. Tive a sensação de ser onipotente, experimentei uma felicidade incrível, coisa alguma, nem ninguém, poderia me tirar isso. Senti-me um imortal, um deus.
         Quando o beijo acabou demorei um pouco para reajustar minha respiração, eu tremia como um filhote assustado. Ao abrir os olhos, deparei-me com uma noite tão clara quanto um dia de verão. O Nada começou a falar-me sobre coisas sem sentido ou importância, frívolas e sem nexo.
         Eu estava apavorado com tudo aquilo que acabara de acontecer. Tentei disfarçar, mas não conseguia. E ante aquele medo imoto e quedo, dei uma desculpa qualquer e parti. Durante o caminho não pude coordenar meu próprio raciocino.
         Quando cheguei ao meu destino, procurando a chave da porta nos bolsos da minha calça velha e surrada, um receio profundo e repentino me abateu. Tive vontade de correr, de gritar, de chorar, entretanto, tudo o que fiz foi respirar fundo e prometer a mim mesmo que não cairia numa trama do destino sempre perverso. Encontrei a chave, enfiei-a na fechadura, girei-a. Antes que eu tivesse tempo de pegar na maçaneta, a porta começou a abrir-se. Não sei por qual motivo, não pude escancará-la e entrar de uma vez. Ela foi abrindo-se aos poucos, o ranger agudo das dobradiças me fizeram arrepiar inteiro, estremeci.
         Pude sentir o bafo quente e seco que vinha de dentro. Entrei com passos leves e contidos. O lugar não parecia com aquele em que eu estava horas antes e no qual eu tinha passado boa parte de minha vida. Todas aquelas paredes, corredores, cômodos, antes tão alegres, seguros, amigos, agora pareciam lúgubres, tristes, repletos de uma eloquência e nostalgia que eu desconhecia existir. Havia muita saudade. Saudades de um tempo que já se foi, que se passou e que não voltará mais.
         Aquele lugar, antes tão amigo, que guardava todos os meus segredos, agora tinha se tornado meu inquisidor, me apontava, acusava. Sentia-me acuado!

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

NADA E TUDO - Título Provisório - CAPÍTULO UM



UM

Era noite, o tempo ameno, a lua, alva, banhava os Lamentos com sua luz pálida e sua lascividade torturante. Eu, ali, sentado no cálcio moldado, muito embora consciente, estava perdido numa inconsciência causticante. Os pensamentos fluíam, refluíam, iam e vinham numa velocidade incrível. Já havia tempo eu estava assim. Eu não conseguia. Coisa alguma podia me tirar dessa espécie de transe déspota, de mansidão revolta. Eu tentava desesperadamente, mas não conseguia ajudar a mim mesmo. O rubro líquido não me distraia das imagens, vozes e presenças na minha cabeça. As horas se arrastavam lânguidas e preguiçosas, o tempo não corria, os dias eram nada, o nada era o tudo. Sim, é isso, o nada era uma vida, minha vida! Sempre o foi, só que eu não entendia, não compreendia isso.
         Então, o extraordinário eu vi naquela noite. Uma Sombra! Era algo sem forma, sem face, sem peso, sem calor, sem viço, sem brio, sem brilho. Ainda assim era radiante, esplendoroso, atraente, magnífico.
         “Céus, o que é aquilo que vejo? Que se aproxima? Devo estar louco!” – Pensei.
         Meu coração batia de pavor, angústia e êxtase. Pude sentir o sangue pulsando em minhas artérias. Eu queria correr dali, estava com medo, de certa forma, eu já pressentia tudo o que estava para acontecer e não queria que acontecesse, entretanto eu não conseguia produzir movimento. Eu estava fascinado, mesmo sendo uma Sombra era a imagem mais bela que eu já havia visto, e essa imagem se aproximava vagarosamente.
         De repente percebi que minha mente estava limpa, não havia mais lembranças de outrora, de certas auroras, de inúmeros crepúsculos. Não havia mais vozes, nem rostos. Tudo o que havia era uma Sombra e um som ritmado e cadenciado, rápido e forte.
         Tudo começou a girar, eu já não sabia onde estava, nem quem era, nem o que estava fazendo. Estava difícil respirar, parecia que o ar era tão denso quanto o chumbo, parecia que meus pulmões nunca mais se inflariam novamente. A dor que sentia era indescritível; E essa dor trouxe-me um estado de consciência inumana, e como se uma bala perdida, uma flecha flamejante tivesse me acertado o peito em cheio, descobri.
         Descobri que o Nada tinha tomado forma. Descobri que o amava. Que sempre o amei.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

NOITE DE DOMINGO

Às vezes me levanto no escuro.
Quando a casa está toda escura.
Quando todos já estão dormindo,
E eu estou acordado.
É como estar vivo e morto ao mesmo tempo.
É como estar no meio do caminho,
No Universo do meio,
Onde as pessoas que estão vivas estão sonhando,
As pessoas que estão mortas estão onde estão,
E eu estou no escuro,
No silêncio.
Muitas vezes sinto-me estranho.
Há vezes em que sinto uma certa tranquilidade.
Imagino que sou como todos.
As pessoas não são boas nem más.
Mudam, e isso é tudo.
Ou melhor,
Transformam-se.
E o que é importante é saber em que é que se transformam.
Às vezes são como pequenos anjos,
Outras são como pequenos demônios.
Entretanto todos são simplesmente.
E durante a noite,
Ficam mais pesadas,
Ou mais leves,
Mais sombrias,
Mais lentas,
Mais nervosas,
Mais doces,
Mais duras,
Ou mais humanas.
E eu estou no Universo do meio,
Eu estou no escuro,
Estou no silêncio.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

É OU NÃO É INACREDITÁVEL?

         Eu faço a minha parte, tento sempre fazer o meu melhor, se alguém não tem capacidade suficiente para entender pode ser que seja realmente burro (o que é pouco provável, pois somos todos dotados de inteligência), entretanto acredito que seja tão pobre de espirito que sua miséria grandiosa não lhe permite o entendimento ou, ainda, a pessoa até chega ao entendimento, mas a omissão sempre será mais conveniente.
         Mas isso para mim, agora, é irrelevante. Não quero que me entenda. Eu, na verdade, quero dizer um grandioso e sonoro FODA-SE para quem não me entende.
         O que é realmente inacreditável e em mim provoca náuseas é que há tanta coisa a ser feita para melhorar a vida dos que estão a nossa volta e nos deparamos com tantos seres que estão mais preocupados com a trepada de um sábado a noite nada produtivo a fazer algo que realmente faça valer a noite não dormida.
         Isso é ou não é inacreditável?
          É lógico que todos têm o direito de fazer escolhas, esse não é problema, e sim o é quando nos apercebemos que existem seres que às vezes são tão cruéis, insensatos, fúteis, mesquinhos e superficiais que fica difícil acreditar que são verdadeiramente humanos, que dão mais valor ao prazer efêmero da carne, quando seria mais útil e belo dar valor àquilo que sustenta a alma: A AMIZADE.
         É realmente surpreendente ver que essa mesma pessoa critica o modo como oriento a minha vida. Que diz que preciso aprender a me amar (isso só pelo fato de que sou capaz de amar incondicionalmente), depois vem me falar de vazio.
         Entenda: o fato de eu conseguir ser intenso com meus sentimentos para com os outros, não significa que não me amo. Pelo contrário é justamente isso que me faz amar-me, pois que me faz descobrir os meus limites (por vezes até superá-los) e me dá a certeza daquilo que vai em meu coração. Você sabe o que há no seu?
         Se sua vida é vazia! Preenche-a.
Todavia preenche-a de verdade, de coisas que lhe renderão frutos e não tentando sugar partes da minha acreditando que a piedade que você vê em meus olhos são os sentimentos que nutro por você no meu coração, por que mesmo que você visse o que há nele, creio ser improvável que entenderia. Afinal você não é capaz nem mesmo de discernir a grande diferença entre amor e amizade.
         Minha vida é cheia de altos e baixos, como a vida de todos é claro, mas é intensa, é punk, é louca, é emocionante. Portanto continue aí no seu mundinho, mas não acredite que meu mundo gira em torno do teu umbigo, meu universo não gira em torno nem mesmo do meu próprio. Minha vida é muito maior que isso. E não queira se preencher dela, afinal tentei fazer com que você fizesse parte, tentei te mostrar o melhor dela, você não quis, então, agora o que posso te dar não vai te satisfazer.
Sacou?


Texto escrito a duas mãos pelos irmãos:
Lyne Högan & Iago Tödan

terça-feira, 8 de novembro de 2011

CHUVA

A chuva
Cai duramente
Queima, secando
Um sonho
Ou uma canção
Atinge-te tão fortemente
Que de todo te preenche
E vai-se embora de repente
Respira
Sente
Ama
Liberta
Sabe, no fundo do teu ser
Como o sangue sabe ir ter
Do teu coração à tua cabeça
Que é um todo, uma só peça
E que brilhas
Como a estrela mais brilhante
Transmissão tardia
À meia-noite, na telefonia
E não para de girar
Como uma bailarina a 45 rotações
A dançar ao som do rock and roll
Sabe que está agindo bem
Não largue a quem te tem
Aguente esta noite também
E brilha como a estrela mais brilhante
Transmissão tardia
Á meia-noite, na telefonia
E não pare de girar
As tuas novas 45 rotações
Todos os inaptados e falhados
Sabem bem
Girando ao som
Do rock and roll.