Não lembro exatamente da idade que eu tinha, mas eu era muito garoto, um menino mesmo quando aconteceu. Na época eu não entendia o que eu estava sentindo, porém sabia que era ruim, muito ruim mesmo.
Eu tinha vontade de falar sobre aquilo, mas falar o quê com quem?
De certa forma, eu sentia uma angústia, parecia que estava perdendo algo muito importante na minha vida, não podia dizer que estava triste, mas havia decepção.
E os questionamentos que eu me fazia. Eram melancólicos. Pq ela fez isso? Será que nunca mais vai voltar? O que vou fazer sem ela?
Depois veio a pior parte do processo, a raiva. Eu tinha raiva dela, eu colocaria outra no lugar. Uma outra superior, que me desse mais do que ela me dava. Eu a odiava com todas as forças do meu ser. Nunca mais eu pensaria nela, nem lembranças restariam.
Mas não foi isso o que aconteceu.
Até hoje me lembro daquele comercial de televisão anunciando que a Kolynos sairia do mercado por causa da concorrência. Mas quem era essa tal de concorrência perto de mim? Eu era mais importante do que a concorrência. Ela não podia me deixar por causa da concorrência. E aquele tiozinho que fazia o anúncio, sujeito insuportável, odioso. Ele a queria só para si, a culpa era dele!
Iriam deixar a Sorriso em seu lugar, e deixaram – é uma boa pasta. Mas quem era ela? Uma estranha que não poderia substituir minha Kolynos.
Ah, minha Kolynos! Aquela pastinha ardida que eu conhecia desde que tinha aprendido a usar escovas de dente – sim usar escovas pq escovar é outra história. Pq me deixava desse jeito? Pq? Pq? Pq?
Então, numa atitude desesperada, fiz meu pai comprar quase todas as Kolynos que haviam na prateleira do Mercado Almeida (um mercadinho aqui perto de casa). Eu tinha esperanças de que um dia a Kolynos voltaria, até lá durariam as que eu tinha. E, novamente, não foi o que se deu.
O tempo passou, meus tubos de creme dental Kolynos acabaram-se um a um. Decidi que era hora de encontrar uma outra. Qualquer uma, menos a Sorriso, ela nunca. Eu não substituiria a Kolynos por aquela que tomou seu lugar descaradamente. Foi então que conheci a Heim.
Linda vinha num saquinho verde brilhante, era gostosa, mas não era a minha Kolynos, tentei várias outras, mas nenhuma a substituía, eu a queria de volta.
E assim continuei por muito tempo, agora uso Sensodyne por ordem do meu dentista. Porém ainda penso na minha Kolynos.
Hoje eu entendo que o que senti na época foi o sentimento de traição. Sim a pasta de dentes Kolynos me traiu, mesmo que ela volte não a usarei. Hoje, depois de muitos anos, já sofri outras traições, mas nenhuma tão grave quanto à da Kolynos.
Iago Tödan